Pop-Rock Brasileiro e os Rip-Offs.
Plágio ou Inspiração?
Já virou clichê comentar o caso em que Jorge Benjor ajuizou ação contra Rod Stewart por plágio e venceu.
Trata-se da famosa “Taj Mahal”, cujo refrão -aquele “Te-te-te-re-tê”- foi
copiado nota-a-nota por Rod na linha melódica do refrão da sua não menos
célebre “Do Ya Think I’m Sexy”, de 1978, verdadeiro standard da rádio Antena 1
e similares em todo o Brasil.
Em inglês, usa-se para designar essa manobra musical a pejorativa expressão rip off, que em bom português seria o
equivalente a currar. Um evidente rip-off e pouco comentado é aquele feito
por David Bowie em “Ziggy Stardust”,
no início do refrão, naquela parte onde David canta “so where were the spiders while the fly tried to break our balls”. A sequência de acordes é
praticamente a mesma de “Stairway To Heaven” do Led Zeppelin, quando
Robert Plant berra “And as we wind on
down the road / Our shadows taller than our soul (…)”, no climax da música,
antes do final. Como
tanto uma música quanto a outra são dois dos maiores clássicos do rock de todos os tempos, dá pra perceber bem o tanto que os rip-offs são mais comuns do que se
imagina.
Nos anos oitenta, época áurea do pop-rock
nacional, algumas bandas brasileiras se destacaram com músicas inteiramente
originais e outras se consagraram sem tanta originalidade. E havia, ainda, os covers declarados, como “Astronauta de Mármore” do Nenhum de Nós, que é uma competente versão
de “Starman”, também de Bowie e do
mesmo álbum que o clássico citado no parágrafo anterior: “The
Rise And Fall Of Ziggy Stardust And The Spiders From Mars”. Nessa linha, por seu turno, temos Kiko Zambianchi, que fez uma versão escatológica de "Hey Jude" dos Beatles, que empolgou a
cena brega daquela época e que hoje poderia ser considerada cult (do jeito que
a música vem sendo mal analisada ultimamente... vide post anterior). Pois bem, mas e os rip-offs não declarados? E quando a possibilidade de ser mesmo plágio
fica bem na cara? Ora, pesquisando em foros de música dos mais diversos não
encontrei absolutamente nada a respeito dos exemplos que citarei em seguida. O
motivo é simples: as semelhanças entre o original e a cópia na maioria das vezes estão ali, mas os
produtores mudam arranjos, sem alterar a sequência de acordes, aceleram o tempo da música ou, simplesmente, transformam a música, por exemplo, que é ska num
punk-rock paulera e ninguém, aliás quase
ninguém, percebe o rip-off.
Há coisa de dez anos, achei numa loja de discos
usados uma coletânea em vinil do Red Hot
Chili Peppers chamada “What Hits?”.
Gosto desse disco porque tem só músicas da época anterior ao popular “Blood Sugar Sex Magic” de 1991 e como eu
não sou lá grande fã de Red Hot, a coletânea caiu bem a gosto. Me deparei com a
música “Get Up And Jump”, do álbum de estreia de 1984, e não
consegui parar de pensar num dos maiores hits do pop nacional dos anos 80: “Kátia
Flávia”, de Fausto Fawcett, gravada em 1987. O
rip-off da música do Red Hot seria bem naquela parte em que Fausto rapeia “ficou famosa por andar num cavalo branco pelas noites suburbanas”. A estrutura é quase a mesma do primeiro verso
antes do refrão de "Get Up And Jump". Se não é rip-off é no mínimo uma
inspiração em excesso. O resultado foi ótimo e Kátia Flávia até hoje é uma das favoritas
de todo oitentista brasileiro que se preze (incluído o autor deste blog).
Um outro rip-off que me deixou de cara foi feito
de maneira não menos sutil. Louva-se a competência do produtor que o fez.
Trata-se do grande clássico do rock nacional “Bichos Escrotos” dos Titãs, daquele bom disco Cabeça
Dinossauro de 1986. Esse rip-off me instigou muito porque veio de uma banda inglesa que
hoje é uma ilustre desconhecida mas que é, na minha modesta opinião, uma das
grandes expressões do new wave: Haircut 100, sublime
mistura de Flock of Seagulls com Kid Creole & The Coconuts, praticamente
uma versão tropical do Duran Duran! A faixa em questão é “Favourite Shirts (Boy Meets Girl)”, do excelente disco "Pelican West", de 1982. A estrutura ritmica, que se
repete ao longo da música inteira, é praticamente idêntica à de “Bichos
Escrotos”, com a ressalva de que a música dos Titãs deixou de lado o flavor latino
de “Favourite Shirts”. Ambas as músicas são ótimas. Mas o rip-off está
escancarado, basta prestar atenção.
Todo mundo sabe que a Jovem Guarda, enquanto
movimento musical, foi amplamente marcada pelo lançamento de versões em
português de músicas estrangeiras, em geral gravadas originalmente em língua
inglesa ou italiana. Claro que nenhum compositor de fora naquela época deixou de ser
creditado. Nos anos 90, no entanto, o Barão
Vermelho -minha banda brasileira favorita- regravou um antigo samba de
Bezerra da Silva, “Malandragem dá um tempo”. A versão, bem samba-rock, ficou
ótima, eu mesmo a toquei várias vezes. O problema é o solo de metais no início,
no meio e no final da música. É exatamente a mesma sequência de notas do solo de gaita do clássico da banda de funk americana War,
seu maior hit: “Low Rider”. O
problema não foi o rip-off, já que o arranjo encaixou muito bem na música do Barão, mas o fato de a música
incidental não ter sido sequer creditada. Lulu Santos, por exemplo, não deixou de creditar a banda disco The Tramps, quando regravou o sucesso de Tim Maia, "Descobridor dos Sete Mares", ao construir a base de sua versão por cima do clássico "Disco Inferno". O rip-off do Barão, ao contrário dos
anteriores, é amplamente comentado na net e não sei mesmo o que foi feito em
termos de copyright até o momento.
É isso aí, galera. E quem souber de algum outro
rip-off na música pop brasileira que jogue pedras à vontade!